Você comprou um lote de um loteamento não registrado no Registro Imobiliário? A negociação se deu por contrato particular, o chamado “contrato de gaveta”? Se ambas as respostas forem afirmativas, é hora de ligar o sinal de alerta.
Comprar um lote de um loteamento ainda em fase de execução e sem registro pode parecer um bom investimento em virtude dos valores geralmente acessíveis, contudo pode representar uma bela dor de cabeça, tendo em vista a insegurança que o negócio representa. Vejamos:
O parcelamento do solo urbano, a de um imóvel único de área maior em vários imóveis com áreas menores, deve ser feito por loteamento ou desmembramento e necessita seguir os trâmites estabelecidos na Lei 6.766/79, em especial o disposto nos artigos 6º e seguintes. Ou seja, deve haver apresentação do projeto de parcelamento perante a Prefeitura, que, por sua vez, deverá aprová-lo e, em seguida, encaminhá-lo para o registro no cartório competente.
Contudo, iniciam-se os problemas se, na época em que o negócio foi celebrado entre as partes, o parcelamento da área na qual se localizava o lote vendido ainda não se encontrava regularizado e o parcelamento não havia seguido os trâmites exigidos pela Lei 6.766/79.
Isso porque o promitente vendedor, que vende imóvel irregular de loteamento não registrado no Registro Imobiliário, age em flagrante infração ao disposto no art. 37 da Lei de Parcelamento de Solo (Lei n. 6.766/79), cuja cláusula proíbe a venda ou a promessa de venda de parcela de loteamento ou desmembramento não registrado. Também descumpre o dever da boa-fé contratual ao não observar os ditames legais antes de comercializar qualquer imóvel.
Ainda, além da infração civil supracitada, o art. 50, parágrafo único, I, da mesma Lei, tipifica como criminosa a conduta de vender, prometer vender ou permutar imóvel em loteamento não registrado no Registro Público de Imóveis.
Mas e comprador, como fica?
Inicialmente, pode o promitente comprador suspender o pagamento das prestações restantes e notificar o promitente vendedor para suprir a falta do Registro do Loteamento, conforme autoriza o art. 38 da Lei nº 6.776/79. Registrado o Loteamento, o comprador deve imediatamente procurar um Tabelionato de Notas para lavrar a Escritura Pública de Compra e Venda e em seguida registrá-la junto ao Registro de Imóveis da Comarca onde está situado o imóvel.
Todavia, caso o problema não tenha sido resolvido, , passamos a analisar, então, a validade do negócio jurídico, que neste caso é o contrato particular de promessa de compra e venda de lote pertencente a loteamento irregular.
Para que esse contrato seja válido, ele precisa ter um objeto lícito. Contudo, no caso presente, a venda irregular de imóvel situado em loteamento não regularizado constitui negócio jurídico com objeto ilícito (pois a venda de imóvel de loteamento ainda registrado é proibida pela lei), ou seja, não é válido.
Dessa forma, constatada a ilicitude do objeto do contrato de promessa de compra e venda, a conclusão é pela sua nulidade (art. 166, II e VII do Código Civil). Nulidade que é reconhecida desde a data da assinatura do contrato, não permitindo que ele produza nenhum efeito (ex tunc).
Ok, e o que isso significa?
Tendo o promitente comprador adquirido lote pertencente a loteamento não registrado, ou seja, irregular, nasce o seu direito de desistir do negócio por meio da rescisão contratual e da devolução do valor pago.
Assim, uma vez que o contrato se torna nulo, as partes retornam ao estado anterior à sua celebração, isto é, a posse do terreno deverá retornar ao promitente vendedor, o qual também será indenizado pelo tempo em que foi privado de sua posse, mediante o pagamento de aluguéis pelo promitente comprador.
De outro lado, todavia, deverá o promitente vendedor devolver os valores pagos pelo promitente comprador, corrigidos pelo INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) a partir do respectivo desembolso, além de indenização por eventuais benfeitorias construídas.
Não se afasta, nesse caso, também, a possibilidade de recebimento pelo promitente comprador de indenização por danos morais sofridos, quando o transtorno ultrapassar o mero aborrecimento.
Dessa maneira, as partes retornarão ao status quo ante, tendo em vista o reconhecimento da nulidade da avença e a necessidade de resolução contratual.
De todo modo, questiona-se ainda: e se depois de celebrado o contrato, o loteamento for regularizado e registrado?
Se isso acontecer, corra para fazer a Escritura de Compra e Venda e registre-a junto ao Registro de Imóveis.
Isso porque o contrato de promessa de compra e venda não se tornará válido! Ele continuará nulo, visto que o negócio jurídico nulo é insuscetível de confirmação e não convalesce com o decurso do tempo, conforme dispõe o artigo 169 do Código Civil. Portanto,a regularização do lote em data posterior ao contrato celebrado não ratifica o negócio entabulado entre as partes.
O ato ou negócio nulo não pode ser ratificado. Se as partes estão de acordo em obter efeitos jurídicos para o ato viciado praticado, só conseguirão isso praticando-o novamente, seguindo, então, todas as formalidades.
Nesse contexto, temos a tão importante e necessária análise e leitura da matrícula atualizada do imóvel (documento dotado de publicidade), antes de qualquer negociação que o envolva - diligência mínima que compete a todo e qualquer participante de uma transação imobiliária.
Caso tenha ficado alguma dúvida ou queira continuar conversando comigo sobre esse assunto, não deixe de me mandar um e-mail: tamara@barisonadvocacia.adv.br ou contatar por meio do perfil do Instagram @adv.tamarapecinato.
Conteúdo produzido por Tamara Pecinato
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Importante ressaltar que o judiciário possibilita a regularização da gleba através de processo de usucapião, este processo chegando ao final com sucesso o autor recebe o título do imóvel.
Neste caso o autor ficará dispensado dos custos de Escritura, Registro e ITBI.
Fernando Lélis, BH
Show! Muito esclarecedor
Ótimo assunto, parabéns...
Se já fizer mais de 5 anos da data da compra, ainda posso buscar a rescisão do contrato e a devolução do valor pago?